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A (im)perfeição do SUS: pandemia em questão, de Daniel Rodrigues Freire Mota

6 novembro 2021

A (im)perfeição do SUS: pandemia em questão, de Daniel Rodrigues Freire Mota

Em um cenário pandêmico no qual a necessidade de acesso a condições sanitárias se torna indispensável, possuir um sistema de saúde que possui uma capilaridade relativamente eficiente em um país com dimensões continentais se torna um fator de grande valia, ainda mais quando reconhecido como um dos melhores sistemas nessa área no mundo (Folha de São Paulo, 2018). No entanto, esse status não garante uma eficácia completa perante as áreas abordadas, principalmente quando presente perante uma sociedade com modelos de moralidade tão discrepantes.

Nesse contexto, com a pandemia do coronavírus, o medo constante da contaminação seguida de morte já preconizava um pensamento popular de ineficiência do Sistema Único de Saúde no Brasil, no qual reconhece-se a dificuldade de acesso a procedimentos de média complexidade com médicos especialistas. Com a chegada da vacina, uma histeria se apossou do país na tentativa de se fazer prevenir diante dessa patologia vigente. No entanto, outro problema surge em substituição, senão complemento, ao tratamento/prevenção atual: a improbidade e negligência diante da vacina. Dentre os casos que demonstram irregularidades, temos os “furas filas”, pessoas que desobedecem as faixas etárias e grupos no plano de vacinação, comprometendo o processo já debilitado de imunização da população. Isso, aliado ao descaso do governo federal em adquirir a compra de vacinas de maneira devida, transparece o retrato de tais ações que se reflete na própria sociedade brasileira, na qual o espírito de coletividade não se faz fortemente presente, podendo ser visto no próprio descaso do uso correto de máscaras em locais públicos. Em relato pessoal, uma experiência de improbidade me faz testemunha desse processo hediondo, no qual uma situação de corrupção em um posto de saúde quase não me permitia conseguir minha vacinação completa a tempo, em prol de benefícios de familiares presentes em agentes desse sistema de saúde.

Em um cenário onde há a presença de uma patologia devastadora, se torna difícil alavancar pontos positivos em qualquer instituição governamental, nas quais há uma bancada claramente genocida e corrupta. Diante disso, diversos são os casos de corrupção e falta de ética diante da classe médica e política atuante no combate à Covid-19. Exemplificando-se, temos a promoção do processo investigativo através da CPI da Covid diante de diversas acusações e processos ilícitos cometidos trazidas à tona pela urgência da necessidade de um esquema investigativo (G1 SP, 2021), demonstrando o desserviço prestado por meio de  esquemas de corrupção e superfaturamentos na aquisição de vacinas, além do incentivo a tratamentos cientificamente comprovados ineficazes (CNN Brasil, 2021), como o uso da cloroquina pelo próprio presidente.

Aqui alavanca-se que o problema principal, antes de tudo, foi político. Utilizando-se o cenário pandêmico como exemplo, mesmo com o esforço de boa parte do Sistema Único de Saúde em combater o Coronavírus, a negligência por parte do governo tornou a atuação dessa instituição bastante dificultosa. O atraso na compra de vacinas, aliado às falas genocidas e carentes de empatia pelos mortos por essa doença são exemplos da inexistência de interesses em auxiliar a população diante da crise vigente. Os posteriores casos de corrupção presentes no mesmo período vinculados diretamente à Presidência também foram fatores que ressaltam a falta de preocupação com o bem-estar social, no qual se tornou degradado com a piora dos índices socioeconômicos da população em geral (IBGE, 2021). Vale aqui ressaltar que o problema dessa instituição nunca foi a falta desses recursos financeiros na nação brasileira, mas sim a falta de desejo por parte dos Poderes, principalmente o Executivo e Legislativo, de direcionar maiores investimentos nessa área.

Mas, apesar das críticas, não feitas diretamente sobre a ideia da existência e necessidade de uma eficiente saúde pública, necessidade essa que veementemente defendo, o SUS possui seu valor, na tentativa, ainda que enfraquecida no período atual, de oferecer condições de saúde básicas à população brasileira. Em uma análise mais aprofundada da sociedade brasileira, percebemos que a situação problemática que se constrói sobre o SUS não recai sobre a instituição em sua estrutura e recursos, mas em seus integrantes e nos políticos responsáveis por pautas como a saúde pública, se agarrando a interesses pessoas em detrimento à debilidade de recursos. Na medida em que a moralidade já é enfraquecida em nossa sociedade, quer seja nos altos cargos políticos ou na ampla população, ocorre a perpetuação de uma corrupção sistêmica que mata seus próprios praticantes, literalmente, como podemos bem ver na atual pandemia. No entanto, além da atual disponibilidade de vacina contra Covid-19, tratamentos como para HIV (Ministério da Saúde, 2017), que necessita-se de remédios e recursos específicos, além de outros serviços amplamente oferecidos, demonstra que o SUS, mesmo que debilitadamente, fornece estruturas para a melhoria das condições sanitárias nacionais, em um contexto social atual no qual parte da população deseja sua privatização na negligência do principal objetivo desse organismo: saúde gratuita. Ao tratarmos de vidas, o conceito de ideologias políticas devem ser deixadas de lado na medida que se contrapõe à banalização da morte já tão forte, sendo qualquer opositor um assassino como o próprio agente patológico em questão.

BIBLIOGRAFIA

LOTT, Diana. Apesar de problemas, SUS é referência em saúde pública, dizem especialistas. Folha de S.Paulo, 2018. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/seminariosfolha/2018/04/apesar-de-problemas-sus-e-referencia-em-saude-publica-dizem-especialistas.shtml>.

https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2021/05/13/estado-de-sp-lidera-ranking-nacional-de-irregularidades-na-vacinacao-contra-covid-com-40percent-das-denuncias.ghtml

G1. Entenda o que são os 11 crimes que a CPI da Covid deve atribuir a Bolsonaro. G1. Disponível em: <https://g1.globo.com/politica/cpi-da-covid/noticia/2021/10/15/entenda-o-que-sao-os-11-crimes-que-a-cpi-da-covid-deve-atribuir-a-bolsonaro.ghtml>.

Estudo constata ineficácia de cloroquina e hidroxicloroquina contra Covid-19. CNN Brasil, 2021. Disponível em: <https://www.cnnbrasil.com.br/saude/estudo-constata-ineficacia-de-cloroquina-e-hidroxicloroquina-contra-covid-19/>.

MINISTÉRIO DA SAÚDE. Ministério da Saúde estende tratamento para todos com HIV. Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Disponível em: <http://www.aids.gov.br/pt-br/noticias/ministerio-da-saude-estende-tratamento-para-todos-com-hiv>.

Painel de Indicadores. IBGE. Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/indicadores.html?view=default>. Acesso em: 4 Nov. 2021.

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